REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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REIS, João José. A morte é uma festa: Ritos fúnebres e revolta popular no Brasil do século XIX. São Paulo: Companhia de Letras, 1991.

MATTOSSO, Kátia. Bahia século XIX: uma provincia do Império. Rio de Janeiro: Nova Fronteira. 1992.

TAVARES, Luis Henrique Dias. História da Bahia. São Paulo: Editora Unesp: Salvador, BA: EDUFBA, 2001.

A Cemiterada

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No dia 24 de outubro de 1836, entrava em vigor uma lei em Salvador que proibia os tradicionais enterros no interior das igrejas e dava a uma companhia privada o monopólio dos enterros por trinta anos, no cemitério chamado de Campo Santo. Insatisfeitos com a postura do governo da Bahia, um dia após a lei ser outorgada, as irmandades católicas se organizam e vão protestar em frente ao palácio do governo provincial.

As irmandades eram organizações responsáveis pela devoção festiva de santos específicos e seus membros estavam reunidos de acordo com a classe que pertenciam na sociedade. Haviam irmandades predominantes, mas não exclusivas, de brancos, mulatos e pretos, ricos e pobres.  As irmandades se responsabilizavam pelos funerais dos seus membros, chegando a enterras pessoas estranhas por um valor determinado.

No dia 25 de outubro de 1836, as irmandades marcham em direção ao palácio provincial, convidando seus membros e o público em geral para protestar contra a nova lei. A multidão se reuniu, vestidos a caráter, carregando cruzes e bandeiras referentes a sua irmandade, o protesto tomou tal proporção que polícia estimou cerca de duas a quatro mil pessoas. Devido a imensa multidão que se postou frente ao palácio, o presidente da província, Francisco de Sousa Paraíso, aceitou negociar com os principais representantes das irmandades. Devido a pressão exercida, Paraíso decide convocar uma reunião extraordinária  da Assembléia Provincial para rever a lei, acalmando em parte, os ânimos dos protestantes e enquanto a reunião não ocorria para dar o parecer final, os enterros continuariam sendo nas igrejas.

Mesmo com a decisão do governador que atendia, por enquanto, a vontade do povo, um grupo aproximou-se do escritório da companhia do cemitério gritando “vivas às Irmandades e morras aos Pedreiros livres”, em seqüência apedrejaram o lugar. Em seguida,  a multidão marchou sentido ao Campo Santo, que ficava a três quilômetros do centro da cidade, lá a destruição foi praticamente total. Os policiais que acompanharam tudo de perto não puderam fazer nada, a quantidade de pessoas era imensa e usar a força contra homens e mulheres que carregavam cruzes seria politicamente incorreto. A manifestação só teve fim a noite, o cemitério estava destruído e o povo contente. Assim ocorreu a Cemiterada de1836 na Bahia.

“A Cemiterada é um exemplo do conflito entre tradição e reforma, tão comum na formação do capitalismo e dos estados nacionais modernos. Mais especificamente, ela pode ser entendida à luz das mudanças de atitudes frente a morte e aos mortos, em parte do mundo católico, entre meados do século XVIII e meados do XIX, aproximadamente.” (REIS, 2006, p. 229)

DISCUTINDO O TEMA

Observando a cemiterada conseguimos pereceber que foi um movimento atípico dos diversos que vieram a ocorrer naquele período, exemplo da Revolta dos Malês em 1835 e a Sabinada em 1837. Analisando o contexto histórico, observamos que houve uma mudança da organização social da época após o declínio do mercado açucareiro, a população baiana passou por uma crise de abastecimento de alimentos o que causou fome e miséria a grande parte da sociedade, as tensões sociais estavam refletidas em problemas como: crise econômica, desigualdades sociais, preconceito de cor e diferentes ideologias religiosas.

Revolta dos Malês

Percebe-se que havia uma grande preocupação quando se falava em morte naquela época, haviam rituais que deviam ser cumpridos para que os mortos “descansassem em paz”, os baianos se sentiam atraídos pelos funerais, era um dos passatempos favoritos da população. Quando um grande número de pessoas acompanhava o enterro demonstrava o prestígio social da família do morto, poder e proteção para a alma do defunto. As famílias poderosas da época distribuíam centenas de convites para os seus enterros.

As classes baixas, a grande maioria da população, freqüentavam os enterros, pois sabiam que iriam receber gratificações por está ali. O pagamento era feito através de velas utilizadas na cerimônia, dinheiro e comida. Para a classe alta a participação de gente humilde nos enterros representava orações precisas para o bem-estar da alma do morto.

Os enterros eram feitos nas igrejas pois as pessoas acreditavam que morrer em terra firme e ocupar um túmulo em lugar sagrado representava o verdadeiro “descanso em paz”. A igreja era vista como um pedaço do céu na Terra. Ocupar uma cova no interior de um espaço sagrado era uma forma de manter os mortos em contato com o mundo dos vivos, sendo sempre lembrados pelos freqüentadores das igrejas em suas orações.  Os locais dos túmulos eram devidamente escolhidos de acordo com o poder aquisitivo do morto, aqueles que tinha dinheiro para serem enterrados próximo do altar significava estar mais próximo de Deus.

Enterro de uma negra

Muitas pessoas não tinham como serem enterrados em igrejas católicas, a maioria dos escravos eram levados para o cemitério no Campo da Pólvora, onde além de escravos, eram enterrados também, cadáveres de indigentes, em valas e não havia nenhuma cerimônia religiosa. Os escravos se esforçavam para se associar a uma irmandade negra para escapar desse destino humilhante perigoso para as suas almas.

“A irmandade substituía, na vida e na morte, os laços cortados pela escravidão africana no Brasil” (REIS, 2006, p.241)

O escravo buscava na morte, além da liberdade, um respeito que nunca teve quando estava vivo e que o novo cemitério não lhe proporcionaria.

A partir do início do século XIX, a opinião médica brasileira começa a questionar a higienização das igrejas devido os constantes enterros, a idéia de uma solução mais prática e higiênica para os enterros começa a ser elaborada. A reforma funerária, acreditavam os médicos brasileiros, iria significar a civilização do país. Os cemitérios seria adaptados para comportar maior quantidade de mortos, os túmulos teria uma profundidade determinada impedindo a propagação do mau cheiro e serviria de vitrines para exibição de atitudes cívicas, a virtude seria exaltada em lugar da piedade religiosa. Seria um projeto burguês para uma sociedade escravocrata.

Os médicos receberam o apoio do alto clero da Igreja, que acreditaram que a verdadeira religião poderia acabar com os enterros nas igrejas e quem insistisse no antigo costume seria adepto de uma superstição ultrapassada. A Igreja e o Estado cederam a pressão das irmandades, o cemitério foi destruído e os enterros nas igrejas continuaram durante mais vinte anos.

Visconde de Pirajá

O Visconde de Pirajá, foi sem dúvida um dos personagens mais importantes deste movimento, membro conservador da Assembléia Provincial e adepto fervoroso do catolicismo barroco. Pirajá pertencia a duas irmandades de prestígio, as Ordens Terceiras de São Francisco e de São Domingos, valorizava a forma tradicional dos enterros e sua família possuía um jazigo perpétuo no convento franciscano, simbolizando assim privilégios aristocráticos consagrados. Pirajá encabeçou o manifesto contra o cemitério recebendo 280 assinaturas, um número muito alto devido a grande maioria analfabeta que compunha a sociedade. A proibição de enterros nas igrejas poderia causar o rompimento com a ordem social e política.

Ficou evidente que o movimento da Cemiterada contou com as diferentes classes sociais, cada uma com um propósito, porém um único objetivo, impedir a proibição dos enterros nas igrejas. O enterro nas igrejas simbolizava os privilégios e poder dos senhores, a transferência dos enterros determinaria  o rompimento da ordem senhorial dando lugar a ordem burguesa.


Objetivo

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Irmandade religiosa

O tema tem como objetivo trabalhar a Revolta da Cemiterada, que foi um movimento ocorrido no dia 25 de outubro de 1836, devido a uma lei que outorgava a uma companhia privada o monopólio dos enterros em Salvador por trinta anos, no cemitério do Campo Santo. Causando insatisfação as diferentes classes sociais da época, que abraçaram a mesma causa: impossibilitar as transferências dos tradicionais enterros nas Igrejas para os cemitérios. Quais os reais interesses as classes envolvidas? Por que transferir os enterros das igrejas para o cemitério quebrando uma tradição de muitos anos na Bahia? Como foi possível, poderosos da época, (como o Visconde de Pirajá), aderir ao movimento que aparentava ser de cunho popular?
É o que vamos discutir no próximo texto.

 

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